Filhota,
Começamos outro dia a nossa compostagem em casa. Foi uma alegria ver a tua animação com a tarefa de arrumar o lixo, encontrar as folhas e brincar com as minhocas vermelhas. O dia-a-dia pode ser mesmo muito mais bacana do que aprendemos a fazê-lo, não é?
Agora é tempo de iniciar a nossa horta. Comecei a estudar o assunto, vai ser mais um para aprender juntos. Tio Jê e vovós Nina e Geny poderão ajudar bastante também, que eles são já hortelões bem mais experientes que nós. Logo você vai poder levar alecrim e manjericão para os colegas na escola, como os temperos indianos que a mamãe levou na aula de culinária outro dia.
E continuamos a inventar novas formas de comer melhor, mais saudável e gostoso. Não me canso de gostar de descobrir sabores novos com você, nesta altura da vida. Te falei que soube que nos Estados Unidos há 50 anos as pessoas costumavam gastar duas vezes mais com alimentação do que com despesas médicas, e que hoje é o contrário? Devíamos mesmo vir fazendo alguma coisa muito errada.
Precisamos ver quando será a hora da nossa mudança de casa. Mas preciso te dizer que gosto demais de poder te levar a pé na escola, e ir caminhando para o trabalho. Você não sabe o privilégio que é isso e como seria bom se todos pudessem organizar-se para viver assim. A tua cadeirinha na bicicleta ficou ótima também, foi uma delícia aproveitar a ciclovia nova no caminho para a casa da dinda. Me lembra depois de ver com a Prefeitura a questão do replantio das árvores que foram derrubadas na frente do nosso prédio?
O papai continua tentando dedicar-se mais a tudo isso no trabalho, colaborando com projetos de mobilidade, saneamento, energia, reflorestamento e tanto mais. As mudanças climáticas e o meio-ambiente nem eram um tema inicial no programa do papai na TV, e no trabalho com a cidade, mas foi ficando cada vez mais claro que não poderia ser assim. O bom é que gosto muito disso, mesmo impressionado com os desafios. Acho que vai ser mesmo sempre mais impossível falar em política, cidadania e no nosso destino comum sem pensar em sustentabilidade e no que significa afinal viver bem neste planeta.
Estive faz pouco na Amazônia sem você. Fui com a mamãe e ficamos o tempo todo pensando em quando poderíamos ir juntos, com teus primos também. Lá nesta época eles dizem que é verão, por ser a época sem chuvas – logo mais será o inverno, em que sempre chove muito. É o contrário aqui do Rio, em que nos preparamos agora para um verão daqueles… Lembrei do tempo que passamos em Boston no último ano, em que você pôde ver comigo as quatro estações, com a neve, as folhas vermelhas, as flores e o calor. Também do nosso acampamento na serra do Rio, procurando juntos a vista do Dedo de Deus no meio da neblina. E das praias que conheci tão diferentes de hoje quando tinha a tua idade na Bahia. E de tantos lugares ainda por descobrir juntos no mundo…
Será que vamos conseguir que você possa viver tudo isso, e partilhar com teus filhos, com a mesma alegria que dividimos hoje? Você não sabe a felicidade que é sentir-se parte de um tempo muito maior do que nós, quando se é pai. Esta é, afinal, a própria magia da nossa relação com a existência, não é? Espero de verdade saber contribuir para legá-la inteira para você, e que todos saibamos fazer isso em conjunto também.
beijos infinitos,
Papai